sexta-feira, 1 de julho de 2016

Paralelos I

                                                                                         — Usted escribe, supongo.
                                                                                         — No — dijo Oliveira —. Qué voy a escribir, para eso hay que tener alguna certidumbre de haber vivido.
                                                                                         — La existencia precede a la esencia — dijo Morelli sonriendo.
J. Cortázar, Rayuela, Cap. 154

As paralelas, como se sabe, encontram-se no infinito. Discutir o infinito seria muita pretensão, mas pode-se afirmar com aceitável clareza que ele pode estar, em relação a um ponto ou intervalo de uma reta, a sua frente ou para trás, de modo que em matemática se trabalha com (+) infinito e (-) infinito. Adaptando-se isso à imagem tempo-rio de Heráclito, pode-se afirmar que o infinito a que nos referimos pode estar à montante ou à jusante do ponto ou intervalo que se considera.

Falando de autores e suas obras, ao traçarmos um parelelo em cada caso veremos com mais facilidade um encontro à montante ou à jusante, ainda que eles não sejam mutuamente exclusivos. Arbitrariamente, definiríamos como encontro à montante aquilo que vem primeiro, ou seja, o homem, o autor; à jusante estariam suas circunstâncias ou as reverberações de suas obras.

Vamos falar aqui de um paralelo em que o encontro à montante é mais evidente: o Pequod e o Patna. Falamos dos barcos, e das obras a que pertencem, porque seria muita pretensão falar do conjunto da obra desses autores, em cujas trajetórias vamos buscar o encontro das retas.

De fato, é mais fácil ver a semelhança entre dois homens do mar que se aposentam e começam a escrever com base em suas vivências do que nos destinos de Ismael e Jim, marcados respectivamente pelo Pequod e pelo Patna. Talvez a grande diferença entre estes barcos seja justamente sua relação com o destino: o Pequod é o destino, enquanto o Patna determina um destino: Ismael é um títere dentro do Pequod, enquanto Jim o é depois do Patna. Se o Pequod é inferno, onde homem e natureza se enfrentam, o Patna é maldição.

Melville, terminado o drama que se propôs narrar, descarta seu narrador: não sabemos nada de Ismael depois de resgatado pelo Rachel. O Lord Jim de Conrad passa o resto de seus dias depois do Patna como escravo de uma coragem que precisa demonstrar. Torna-se difícil ver o ponto de encontro em (+) infinito. Em (-) infinito, temos dois homens que, à diferença de outros grandes escritores, como José de Alencar e J.L. Borges, primeiro viveram e depois contaram histórias interessantes.

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