sábado, 9 de julho de 2016

Comunicação

Matemática e suas afilhadas: uma linguagem que, apesar das exceções, do princípio da incerteza de Heisenberg, aceita algumas verdades, reais o suficiente para que se dividam bombons entre sobrinhos ou se preveja um eclipse da lua. Em outras palavras, uma linguagem objetiva.

Fora daí, a objetividade é sempre ilusória. A carga de subjetividade é sempre maior do que a de realidade. Quem "lê" a chapa de um gel de poliacrilamida onde um gene foi sequenciado interpreta a ordem das bandas, bem menos do que se interpreta um poema, mas num processo análogo. Não importa; o que é preciso é que se chegue a um efeito satisfatório, algo que encontre consonância com as expectativas do leitor, e isso é tão verdadeiro para o gel quanto para o poema. Se houver dissonância, a chapa irá para o lixo e o poema terá fracassado: fechado dentro do livro, ficará como o gênio das Mil Noites e Uma Noite, aguardando que alguém o descubra.

Então o que fazemos nós que lidamos com o verbo, tão superficialmente (ainda que não falazmente) divididos em cientistas, filósofos, jornalistas, ficcionistas e poetas, é emitir ondas na esperança de que alguém as capte e as aceite, no sentido de que se modulará para ondular com elas enquanto durar a mágica da transmissão. Falando de magia, os que a ela são avessos talvez captem as ondas, mas não dançarão com nossos fantásticos escritores fantásticos; os impacientes não ficarão sintonizados na Montanha Mágica tempo suficiente para sentirem o quanto dói nos ouvidos um portaço de Mme. Chauchat; os céticos desprezarão o kardecismo; os intolerantes à ambiguidade irritar-se-ão com a interminável disputa entre Kimura e os selecionistas. Talvez as ignorãças do Manoel de Barros, contra o desejo do autor, sejam para poucos.
           
O problema, às vezes, é alimentar a fonte emissora. Noutras vezes, o problema é ter alguém para pré-avaliar a emissão, a fim de que não se congestione demais o espaço. Para manter um critério minimamente justo, é preciso admitir que os editores da Nature, da piauí e da Companhia das Letras têm as mesmas chances de errar, e que eventualmente o fazem.


O resultado me parece uma salada em que muitos pensamos que temos algo a dizer, seres humanos (errare humanum est) fazem uma pré-avaliação do que se vai divulgar, exceto em blogs como este, facebooks e modernices afins, e o que finalmente vai ao ar fica por aí, errando até encontrar um entendimento cujas expectativas entrem em consonância com a mensagem.

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