Matemática e suas afilhadas: uma linguagem que,
apesar das exceções, do princípio da incerteza de Heisenberg, aceita algumas
verdades, reais o suficiente para que se dividam bombons entre sobrinhos ou se
preveja um eclipse da lua. Em outras palavras, uma linguagem objetiva.
Fora daí, a objetividade é sempre ilusória. A
carga de subjetividade é sempre maior do que a de realidade. Quem
"lê" a chapa de um gel de poliacrilamida onde um gene foi sequenciado
interpreta a ordem das bandas, bem menos do que se interpreta um poema, mas num
processo análogo. Não importa; o que é preciso é que se chegue a um efeito
satisfatório, algo que encontre consonância com as expectativas do leitor, e
isso é tão verdadeiro para o gel quanto para o poema. Se houver dissonância, a
chapa irá para o lixo e o poema terá fracassado: fechado dentro do livro,
ficará como o gênio das Mil Noites e Uma Noite, aguardando que alguém o
descubra.
Então o que fazemos nós que lidamos com o
verbo, tão superficialmente (ainda que não falazmente) divididos em cientistas,
filósofos, jornalistas, ficcionistas e poetas, é emitir ondas na esperança de
que alguém as capte e as aceite, no sentido de que se modulará para ondular com
elas enquanto durar a mágica da transmissão. Falando de magia, os que a ela são
avessos talvez captem as ondas, mas não dançarão com nossos fantásticos
escritores fantásticos; os impacientes não ficarão sintonizados na Montanha
Mágica tempo suficiente para sentirem o quanto dói nos ouvidos um portaço de
Mme. Chauchat; os céticos desprezarão o kardecismo; os intolerantes à
ambiguidade irritar-se-ão com a interminável disputa entre Kimura e os
selecionistas. Talvez as ignorãças do Manoel de Barros, contra o desejo do
autor, sejam para poucos.
O problema, às vezes, é alimentar a fonte
emissora. Noutras vezes, o problema é ter alguém para pré-avaliar a emissão, a
fim de que não se congestione demais o espaço. Para manter um critério
minimamente justo, é preciso admitir que os editores da Nature, da piauí e da
Companhia das Letras têm as mesmas chances de errar, e que eventualmente o
fazem.
O resultado me parece uma salada em que muitos
pensamos que temos algo a dizer, seres humanos (errare humanum est) fazem uma pré-avaliação do que se vai divulgar,
exceto em blogs como este, facebooks e modernices afins, e o que finalmente vai
ao ar fica por aí, errando até encontrar um entendimento cujas expectativas
entrem em consonância com a mensagem.
Nenhum comentário:
Postar um comentário