segunda-feira, 19 de setembro de 2016

Natação II

Quando fui de muda para Porto Alegre, comecei nadando na Stilo, rebaixado para uma piscina de 18m. Brochante... Decidi entrar para a escolinha do União, que só nadava na piscina semiolímpica interna. Quem era a treinadora? Denise, irmã da Lisia! Essas sortes na vida... Numa noite de inverno, ela me disse: faz o seguinte: taqui o treino, sobe e vai nadar na olímpica. Putz! Se aquilo não foi um orgasmo... Nadando sozinho, num frio do cacete do lado de fora, mas quentinho na água... No fim do ano, ela insistiu tanto que fui com a equipe nadar o masters no IPA e fiz feio, os guris que nadavam de verdade fizeram uma cara de nojo quando tiveram de me incluir no time dos 4 X 100 medley.

Seguiram-se anos de natação só para mim, sem maiores emoções, até que fui para a escolinha de Georgetown, que por alguma razão, talvez autocrítica num contexto muito mais competitivo do que o brasileiro, não competia. O que não quer dizer que não treinava: cheguei a nadar 3500m em 50’ aos 28 anos de idade, coisa que eu nunca acreditaria ser capaz de fazer se não tivesse feito! Num sábado de manhã, nadamos mais de 4000m num ritmo mais lento; nunca voltei a nadar tanto. Lembro de uma louca, que deve ter sido competidora fera na juventude, que chegava mais cedo pra aquecer, nadando com dois moletons!

De volta a Porto Alegre, virei sócio do União e continuei nadando por minha conta, agora devidamente habilitado para nadar na piscina olímpica, e em Quatro Ilhas sempre que dava. Em 2013, fiquei sabendo que o União tinha uma equipe masters de travessia e me juntei à turma do Ken. Pela segunda vez na vida, agora aos 43, me puxaram para nadar 3000m em 1h. Tesão! Baita bem-estar depois de nadar. Participei com eles de uma travessia em Itapema, achei legal, mas não fui a outras. Em 2014, voltei a viajar muito, quebrou-se a continuidade dos treinos e achei que não adiantava nadar com a equipe quinze dias e parar, perdendo toda a progressão dos treinos. Voltei para minha natação solitária.

Nesse 2016, completaram-se 40 anos de natação. Nunca parei, a coisa nunca perdeu a graça pra mim. Nadando em Quatro Ilhas, sem viradas nem contra o cronômetro, é focar para refinar o estilo, tentar consertar as pequenas coisas que fazem diferença para chegar o mais perto possível daquele dom do Ari: elegância e eficiência. É impressionante como detalhes aparentemente mínimos ajudam a consertar o nado: por exemplo, basta focar para a mão sair com a palma bem virada pra fora para arrumar toda a parte aérea da braçada, e por aí vamos... O lance é buscar fazer o corpo conversar com o mar, sempre com humildade, para tentar casar o nosso ritmo com o dele.

quarta-feira, 14 de setembro de 2016

Natação I

Outro dia, a mãe conseguiu me tirar do sério ao insistir que eu não sabia como tinha começado a nadar. A história é mais ou menos assim: aí pelos seis anos, depois de umas quantas crises de asma, resolveram me levar para consultar o falecido Dr. Palombini, que era um baita gente boa, apesar de parecer a criatura do Dr. Frankenstein, e ele me mandou nadar para aumentar a capacidade respiratória e tal. Entrou o verão e um dia no clube começaram a arrebanhar a gurizada pra ver quem já sabia nadar e em que nível, porque ia ter escolinha e um campeonato no final. E então começa aquela história da sorte que eu dei na vida: a iniciativa tinha partido da professora, que era sócia do clube e ninguém menos do que Lisia Barth, campeã sul-americana de natação no nado de costas e que hoje dá nome a um complexo de piscinas do União, onde se criou como nadadora.

Pelo tamanho, a triagem da gurizada da minha idade foi na piscina média, mas logo depois da primeira tentativa ela me tirou da água e me mandou esperar na borda da piscina grande, na qual eu não consegui nadar seu comprimento nem naquela hora nem em outras tentativas mais adiante, mas nadava bem a largura, que era maior do que a piscina média. No tal do campeonato, saí com o ouro. Já é um incentivo...

Estamos falando de 1976. A única piscina aquecida da Terra dos Ventos sem Nome era a de uma clínica de fisioterapia, a Paroto, que tinha incríveis 13m de comprimento, metade de uma piscina semiolímpica! Mas era o que tínhamos, vamos nadar. Até onde eu lembro, a Lisia não foi a primeira professora ali, mas foi mais adiante, quando suas filhas nadaram conosco. Eu não nadava sozinho, tinha colegas da escola comigo, mas acho que ao redor de 1984 só sobrava o Guilherme, e aí apareceu o Geraldo Aranha, estudante de Oceano, que tinha se destacado no brasileiro infantil e juvenil, para nos treinar. O Aranha tornou-se de saída um amigo querido; em 2014, trinta anos depois, no meio de uma viagem de moto, fiz questão de ir visitá-lo no Tamar de Ubatuba, onde é um dos chefes da coisa, e acabei jogando bola com seus filhos na casa deles. Desde que o conheci, ele sempre teve moto e naquele dia tomamos um banho de chuva memorável entre o Tamar e a casa dele. Contudo, não dá pra dizer que foi a amizade com o Aranha que me levou a ter moto desde cedo e a fazer Oceano, a influência foi na piscina mesmo: foi ele quem me disse que meu estilo tinha de ser golfinho, que hoje voltou a se chamar borboleta.

Um dia, o Aranha levou para nos dar uma demonstração seu amigo Ari, que era da Oceano, trabalhava na Caixa e havia sido campeão brasileiro juvenil no nado de peito, o que não é pouca merda... E aí nós vimos como um cara surfa numa piscina, como aproveita cada movimento e tal...

Em 1986, acampado em Quatro Ilhas com Guillermo, subimos para o costão do lado direito, que é o mais agitado, e fiquei olhando o ritmo das ondas, achei que dava pra pular sem perigo e decidi: vou nadar essa porra. Pulei da pedra e fiquei surpreso com o quanto foi fácil atravessar a praia até o costão do camping. Até hoje, acho que a única coisa na vida melhor do que nadar em Quatro Ilhas é sexo. Aliás, só se for do bom, porque tem muito one night stand que não chega nem perto...

Bom, rolou muita água embaixo dessa ponte, sempre lembrando que não dava pra treinar pra competir de verdade numa piscina de 13m. A Lisia era casada com meu xará Lawson, presidente do SC Rio Grande, o Vovô do futebol brasileiro, e não tenho dúvida de que foi a influência dela que levou à piscina semiolímpica aquecida do clube, a primeira da cidade. A essas alturas, eu já tinha 20 anos, a hora de treinar para competir meio que já tinha passado. Ainda assim, só ter a piscina já era um baita estímulo e a Lisia, manobrando com habilidade como sempre, abriu a possibilidade de se nadar como sócio-atleta e foi bater na porta da Oceano, onde ela sabia que tinha muita gente de fora e alguns que tinham nadado a sério antes de irem pro fim do mundo, e formou-se uma equipe. Dessa galera com quem fui nadar, aprendi muito com o Guto, que era da minha turma na Oceano e tinha se destacado no nado de costas, e era um prazer ver o Rodolfo nadar borboleta. Vou arder no fogo do inferno por muitas razões, entre elas por ter esquecido o nome da mineira que mais me ajudou a treinar e era nadadora de peito. Talvez, Mariângela...

Nosso treinador no clube era o Max, baita gente boa que também já nos deixou, fera no basquete, mas não tanto em natação, e um dia ele levou um amigo para nadar, que era ninguém menos do que o Ari, que continuava na Caixa, tinha começado a fumar e criado barriga, mas dentro d’água continuava uma mistura de elegância com eficiência impressionante! As braçadas que deu com a gente acordaram alguma coisa dentro do Ari e ele virou nosso treinador de fato. Mais uma sorte na vida... Aliás, nesse caso, acho que foi uma sorte na vida do Ari também: parou de fumar, voltou a treinar de verdade e ficou em primeiro lugar em várias provas nas olimpíadas internas da Caixa, que parece que são coisa séria.

Nadamos todo o ano de 1990 e em abril de 1991 fomos fazer, no Diamantinos, em Satolep, as seletivas para o campeonato gaúcho, que seria em novembro. Eu peguei índice para duas provas, 100m peito e já não lembro a outra, mas deve ter sido 50m livre ou 50m borboleta. Aliás, o índice no peito só pode ter sido obra do Ari, porque nunca tinha sido minha praia antes. Pior do que isso, só o nado de costas, que o Guto tentou me ensinar e ao fazê-lo me mostrou o quanto ele é difícil se o cara quer treinar para competir. Só que pouco depois, no começo do inverno, a caldeira que aquecia a água quebrou e passamos meses sem nadar. Quando a consertaram, aí por setembro, achamos que era tarde demais e ninguém foi fazer papelão no campeonato gaúcho.

sábado, 10 de setembro de 2016

Sonhos III

Esse deve ser do começo de 2003, logo antes do III Fórum Social Mundial.

Sonhei que havia chegado a uma ilha onde ia a um encontro, ou talvez especificamente a uma versão do FSM. Os outros participantes do encontro iam acampar numa área delimitada, mas eu, me achando muito esperto, havia estudado o mapa da ilha e encontrado uma gruta conveniente, razão pela qual sequer havia levado uma barraca: apenas um cobertor me bastaria. Entro na caverna, que está numa escuridão completa, e me surpreendo com o quanto seu chão é inclinado. No escuro, imagino que estou numa rampa acentuada, com a parede da gruta à minha esquerda e um abismo à minha direita, então decido acampar ali mesmo: estendo o cobertor no chão, que logo percebo imundo, e me enrolo nele. Meus olhos vão se acostumando à escuridão e vejo, sem me assustar, que à minha esquerda não há apenas a parede que eu havia imaginado, mas um espaço aberto num plano mais elevado, onde vejo passar, de novo sem me assustar, um cara de barba e cabelos claros. Ele tropeça em um banco comprido e se assusta, abaixa-se um pouco e move-se rapidamente para fora do meu campo de visão. Mais pelo som que fez o banco ao levar o tropeção do barbudo do que por qualquer coisa que eu tenha visto, compreendo que o espaço acima e à esquerda de mim é uma igreja, e o susto e a fuga rápida do barbudo me fazem entender que não sou o único que procurou abrigo clandestinamente (eu sem saber) naquela noite, naquela igreja, e compreendo também que seríamos expulsos se descobertos. Em seguida penso que o barbudo corre este risco, mas que eu, mais abaixo e no escuro, estou a salvo. Dentro do sonho, durmo.

Desperto deste sono dentro do sonho com talvez uma repetição do som de alguém tropeçando em um banco da igreja. A escuridão vai se dissipando, até porque o dia vem clareando, e vejo que não estou deitado no chão de uma gruta, mas arriado na cadeira de um teatro que é uma igreja e que o que não me faz falta são vizinhos, dos lados e abaixo de mim.

Por trás de nós, vem entrando um padre para dizer missa. Percebo que é impossível escapar a tempo, mas vejo que meus vizinhos não se assustam e logo me tranquilizo. Estudo melhor minha situação/posição e logo vejo que eu não poderia mesmo ter deixado rapidamente meu lugar, pelo menos não sem molhar os pés, porque estou descalço e longe do chão, como se estivesse numa cadeira de juiz de tênis, e que no piso lá embaixo há uma série de poças d'água. Sigo com os olhos o filete que formou estas poças e vejo que provém de um cooler igual ao meu, pertencente a três homens mais velhos que estão claramente acampados no nível imediatamente inferior ao meu e deslocados à minha esquerda.

O padre chega ao altar para começar a missa e nota-se que ele compreendeu a situação, mas decidiu ser nosso cúmplice: com ar jocoso, faz um comentário do tipo "que bom ver a igreja tão cheia de novos fiéis para a primeira missa" e toca o bonde. O sonho acaba.

Elementos para interpretação, pensando que muitas histórias que conto são na verdade minha versão corrente do que poderíamos chamar de a minha história verdadeira, ou a minha história vista objetivamente por, digamos, o homem de Sírius do Erico Verissimo:
 

  • Ir para uma reunião é ir para o FSM. Compreende-se a minha ansiedade com este assunto, posto que hoje às 17h terei minha primeira reunião como tradutor voluntário.
  • Ilha dá ideia de isolamento, no caso meu isolamento de menino asmático que passava mais tempo lendo do que jogando bola, e que até hoje acha que estas leituras o fizeram mais esperto do que os coleguinhas.
  • A caverna escura de chão sujo onde me acomodo é o ambiente desagradável e perigoso criado e mantido pelos dois escorpiões de plantão, meus pais.
  • A igreja onde afinal me descubro com certo alívio (especialmente depois que fica clara a aceitação da situação pelo padre) é a alternativa ao ambiente ruim onde eu havia me deitado (ou pensava que havia me deitado), e esta alternativa era a minha avó.
  • O barbudo que primeiro aparece representa um hippie, a partir do comentário do Rodrigão que os jovens que vêm para o FSM e acampam no Parque da Harmonia são "hippies fedorentos". Os homens com o cooler reforçam a ideia de gente acampada, mas não tenho uma interpretação para a água no chão e o quanto ela me atrapalhou por estar descalço.

Noutro sonho, possivelmente depois desse, tenho um bate-boca medonho com a mãe. O curioso neste sonho é a presença de D, com quem sonho tão pouco. No sonho, eu sei que ele está morto e ele não. Enquanto caminhamos por uma rua que parece a Lisboa no Cassino, vou pensando se devo ou não contar-lhe que ele já morreu, ou que fatalmente vai morrer em breve.

sexta-feira, 9 de setembro de 2016

Velsos IV

São os últimos, prometo que a judiaria acabou, na língua que me adotou desde a infância e com a qual minha história rende um post curtinho que escreverei e postarei um dia.

El día que me quieras
Tendré ganas de dejarte
Te podría mentir que es porque
He nacido como el gran tiburón blanco
Que de su madre ya sale mordiendo
Y vive solo y libre en el mar
Pero la verdad es que yo vivo
De pequeños sabotajes


***


Sí soy yo y mis circunstancias
Soy yo y el tiempo tragado que traigo en el vientre
Soy las horas que fui y los días que vendrán
El tiempo que es rueda o nada
Lo que no es lo mismo, pero es igual
Soy sombra o sueño lleno de nada
Soy un viento que vuelve a su principio
Torvellino vano donde el demónio en el centro
Es soberbia
Es vanidad
El polvo
Polvo de caminos
Polvo de caminos andados
Polvo de caminos soñados
Polvo del vácuo
La nada

quinta-feira, 8 de setembro de 2016

Keynes

Quando anunciei o blog no Face, prometi que não ia estropiar aqui os mesmos assuntos que estropio lá, e cumpri a promessa. E acho que falar aqui mais extensamente sobre o que está por trás, ou formando, as opiniões tortas que postei lá não quebra a promessa, mas vou começar com uma anedota, mais engraçada, porém mais longa, do que aquela do Lincoln e os trilhos que postei lá. Para a coisa fazer mais sentido e também dar um gostinho, quiçá azedo, do que vem pela frente, vou começar com uma aulinha, que quem conhece derivativos pode pular sem nenhum prejuízo.

O que é um derivativo? É um contrato financeiro entre duas partes cujo valor deriva de outro ativo. Exemplos: o valor de um contrato futuro de soja, negociado em Chicago, deriva do valor da soja, enquanto o valor de uma opção de compra de ações da Petrobras, negociado na BM&FBovespa, deriva da cotação das ações da Petrobras.

Um contrato futuro obriga uma das partes a comprar, ou vender, um ativo por um preço determinado na data de seu vencimento. Na imensa maioria das vezes, a liquidação do contrato se dá com o pagamento da diferença entre o preço acordado e o preço do ativo naquele momento, chamado de “spot”. No caso de um contrato futuro de compra de uma commodity, uma vez na vida e outra na morte pode acontecer de o vendedor não conseguir efetivamente vender seu produto para quem o queira de fato, e aí o comprador de um contrato financeiro é obrigado a pagar pelo produto e recebê-lo fisicamente, o que é um baita perrengue: é só imaginar um banco tendo de receber toneladas de minério de ferro!

Postei no Face que a função original do mercado financeiro era ser um catalisador dos negócios da economia real e que isso foi pervertido numa dimensão inacreditável: criou-se um monstro que não vai ter Héracles que liquide. No caso dos derivativos, eles foram criados para que as empresas se protegessem das oscilações nos preços ou taxas que afetam seus negócios, trazendo mais estabilidade para suas operações. Exemplo: a Bunge está comprando soja a x dólares por tonelada, mas acredita que dentro de três meses, por causa de uma probabilidade de quebra de safra na Argentina, ela pode vir a custar y > x. Ela então procura, através da bolsa de Chicago, outra parte que tenha a visão oposta, ou seja, que acredita que o preço futuro y será menor do que x, e aí eles firmam um contrato que obriga a Bunge a comprar a soja ao preço x dentro de três meses. Na data da liquidação do contrato, a Bunge pode pagar ou receber a diferença entre x e y ou, se tiver necessidade da soja naquele momento e espaço em seus armazéns, pagar o preço x e receber fisicamente a soja. Essa proteção contra oscilações de preços é chamada de “hedge” e especulação vocês sabem o que é. Os derivativos são instrumentos excelentes para especular, por razões que não vou explicar aqui, senão fica demais, portanto o mercado financeiro perverteu isso também: o que era para servir para hedge passou a ser usado para especular. Qual a diferença entre uma coisa e outra? A escala: se eu trabalho com 100 toneladas de soja por ano e faço um contrato futuro de compra de 30 toneladas, estou me protegendo; se faço de 300 toneladas, estou especulando. Da mesma forma, se trabalho com soja e entro em um contrato futuro de milho, estou especulando. A Aracruz Celulose quebrou e a Sadia quase quebrou porque especularam com derivativos cambiais. Dado que as duas empresas são exportadoras, faz sentido se protegerem de oscilações na taxa de câmbio, mas de modo algum no volume em que negociaram derivativos!

E chegamos à anedota! Lord Keynes não foi apenas um dos economistas mais influentes do século XX, mas também um grande especulador. Certa vez, procurou um padre que conhecia e pediu para alugar sua igreja por um fim de semana, para fazer um retiro espiritual privado, e claro que o padre topou, sensibilizado pela oportunidade de ajudar aquela alma a se aproximar de deus, e provavelmente por umas quantas libras também. Quando recebeu a igreja de volta na segunda-feira, estranhou a quantidade de grãos de milho espalhados pelo chão. Explicação: Lord Keynes havia entrado num contrato futuro de compra de milho que vencia na sexta-feira, não conseguiu liquidar o contrato financeiramente e foi obrigado a receber o milho, para o qual achara apenas um comprador que só podia recebê-lo na segunda-feira, de modo que de alguma forma tinha de armazenar os sacos de milho durante o fim de semana, e a igreja foi o “depósito” mais barato que encontrou!

quinta-feira, 18 de agosto de 2016

Guardanapos V

PnE: if you get close enough and play it cool, there's a slight chance that the girls at the bar will perceive your mass and gradually gravitate your way.

***

She raised the cigarette to her lips like a battleship raises its 16-inch guns...

***

Just Comitting to Paper (JCtP): My broken bones are all in places that do not show.

***

JCtP: Toco o sax tenor que nem o Coltrane:
Ele: sheets of sound
Eu: shits of sound!


***

Poucos personagens têm minha simpatia como o velho do Hemingway que apenas buscava "a clean, well-lighted place".

***

E só pro caso de alguém achar que me falta autocrítica:


segunda-feira, 15 de agosto de 2016

Sonhos II

Como me ajudou a dizer a Thaís, quem semeia fantasmas colhe assombrações e, como bem sabemos, isso se refere aos vivos que deixamos para trás, e não aos mortos que nos deixaram. Pois é, então depois de sonhar com C acabado, sua mãe de preto e D, todos nós juntos caminhando pela Dr. Nascimento em direção ao canalete, onde as águas estavam correndo, o canalete cumprindo a função para a qual foi desenhado e construído*, e onde, num canalete mais estreito, paralelo ao “real”, nadavam botos pequenos e azuis... C e sua mãe caindo na água para nadar, D tirando a roupa debaixo de uma ponte para se juntar a eles, movida pela certeza de que eu não demoraria a entrar. E eu com a certeza de que a água estava boa, os botos bioindicadores passando ao meu lado no canalete que nunca existiu... E me privando daquele banho noturno sem nenhum motivo... Como interpretar?

A simples presença dos amigos que no momento do sonho estavam distantes me parece que é uma forma de me acusar de havê-los transformado em fantasmas. D se despindo é um óbvio wish-fulfillment.

E, por baixo de tudo isso, fica a cidade... Será que conseguimos mesmo mudar de lugar como pensamos? Se eu for continuar a sonhar com a Terra dos Ventos sem Nome o resto da minha vida, será que isso não é evidência suficiente de um imprinting invencível? Da outra vez a praça, agora o canalete... Fica a impressão da impressão...

Então eu sou o desmancha-prazeres. Sou eu que não me lembro do endereço aonde seria necessário levar C, sou eu o único que não entra na água...

E os fantasmas... Novamente, N junta-se a eles, seu resgate foi uma triste e curta ilusão. S, que o diabo a carregue, vai logo atrás, de volta ao limbo, de volta a um universo de rostos anônimos que me lembrarão dela quando eu menos esperar e quiser...

E lá vou eu mesmo, sendo guiado por outros cujas intenções não entendo, por outros que são capazes de chegar ao canalete à noite e entrar na água para nadar, como se não fosse nada... E eu, desmancha-prazeres... Não, é muito pouco... Certamente haveria mais para interpretar, se alguém estivesse fazendo as perguntas certas...

* “... Para evitar que em época de cheia a cidade fosse invadida pelas águas, foram construídas (sic) aquedutos, que normalizam o nível das águas. O mais popular é o da Avenida Major Carlos Pinto, que une as águas do Canal do Norte ao Saco da Mangueira. O ‘Canalete’, feito de concreto armado, possui duas comportas nos dois extremos que regulam a entrada e saída das águas.”
    “Cartilha Papareia”, Piragine, Maria L.R. e colaboradores, entre eles, modestamente, YT.

domingo, 14 de agosto de 2016

Velsos III

Esse negócio de andar
                   de bar em bar
ainda vai terminar
            em malefício:
nego trancado no hospício!

Esse negócio de caminhar
pensando em inglês
essa mania de rimar
you want to be
            com
a part of society
não vai acabar bem:
é coisa de quem
não bate bem!

***

A Cidade Baixa
O Bairro Alto
Um golpe baixo
O coração aos saltos
Porto Alegre
Lisboa

Lisboa, Rua das Chagas
(Eu já rogando pragas!)
Tu não chegas
(E eu odeio regras!)
Tua ausência, um chuço
Na minha carne: quase choro
Em que chibos
Por que choças
Andas que não me chegas?